segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

O Poder da Deusa consagrando o cotidiano


O ressurgimento do Sagrado Feminino nos traz uma nova visão espiritual. A espiritualidade centrada no culto à Deusa implica no respeito à natureza e à vida em todos as suas manifestações, no cultivo da compaixão e aceitação nossa e dos outros, no reconhecimento da intuição e sabedoria existentes – mesmo que latentes – em todos nós, na celebração alegra da unidade com toda a criação.
Para sentir o poder da Deusa, comece a perceber o sagrado em tudo que a cerca, em cada dia, em cada lugar. Talvez precise de algum tempo para notar e experimentar conscientemente momentos, vivências, encontros, que antes passavam de forma fugaz sem que você percebesse o seu valor. Adquirindo uma nova consciência a sua vida torna-se mais rica, um acontecimento ou encontro não mais é algo fortuito, as “coincidências” passam a ser facetas da sincronicidade cósmica.
A mulher tem um enorme poder dentro de si. Não é o poder sobre alguém ou contra alguém, é o seu poder inato e ancestral, a sua intuição, percepção, compreensão, compaixão, criatividade, amor e conexão – consigo mesma, com os outros, com o Divino.
Nas antigas tradições e culturas o poder criativo e renovador da Deusa eram o símbolo da própria vida, a Terra e a mulher eram consideradas sagradas sendo suas representações. Nos cultos e mistérios femininos honravam-se os ciclos eternos que marcavam a vida do renascimento à morte, e desta para um novo início através do renascimento. Vida e morte eram interligadas de forma misteriosa e divina, competindo às mulheres as tarefas de recepcionar e cuidar da vida (como parteiras, mães, curandeiras), assistir e auxiliar as transições (como xamãs e sacerdotisas) e servir como intermediarias entre o humano e o divino (profetisas, oráculos).
O poder da Deusa possibilita a expansão do potencial emocional, mental, criativo e espiritual inatos em cada mulher. O poder da mulher está na sua sabedoria, a compreensão intuitiva, imparcial e sábia dos processos e das surpresas da vida. Nem toda mulher pode ser jovem, bonita, culta, rica, mas todas as mulheres podem se tornar sábias, permanecendo serenas no meio do tumulto.
As mulheres que almejam o poder da Deusa cultivam uma forma diferente de espiritualidade, buscando expandir sua consciência, honrando a vida em tudo ao seu redor e transformando o mundano em sagrado. A chave para a transformação espiritual é o enriquecimento e o aprofundamento de sua vida interior, podendo assim acessar e confiar no seu Eu Superior.
Para nutrir e embelezar nossas vidas podemos usar inúmeros recursos, simples ou elaborados, como alguns dos seguintes:
1. Crie um espaço sagrado no seu lar, não somente através de um altar, mas usando sua inspiração, imaginação e amorosidade para que todos se sintam bem, protegidos, nutridos e amados;
2. Crie momentos sagrados – para si mesma ou compartilhando-os com amigos e familiares – caminhando na natureza, ouvindo música suave, jantando a luz de velas, lendo textos que nutram a alma, enriqueça a sua mente e elevem o espírito;
3. Entre em comunhão com a natureza, honrando a Deusa em todos os seus aspectos e manifestações. Não basta encher sua casa de plantas se você não entrar em contato real e profundo com a terra, a chuva, o vento, as nuvens, o Sol, a Lua, os animais – seus irmãos de criação;
4. Respire e consagre seu corpo como a morada da sua alma durante esta encarnação. Procure viver de forma saudável, fazendo suas opções com consciência, sem se agredir e sem culpar – a si ou aos outros – pelos seus problemas ou compulsões. Coma bem para viver melhor. Observe suas fugas e compensações, cuide da sua “criança” carente ou ferida ajudando-a a crescer, curando-a com amor e dando-lhe os meios adequados para se tornar forte e auto-suficiente;
5. Manifeste sua criatividade – escreva, borde, pinte, desenhe, faça colagens, modele argila, cante, recite, dance, aprenda algo novo, componha um poema ou canção, faça pão, comece um diário de sonhos. A mulher que não dá vazão construtiva à sua imensa capacidade criativa pode torná-la em energia destrutiva – contra si ou contra os outros;
6. Coloque em prática os ensinamentos espirituais. Não se contente em ler inúmeros livros ou participar de cursos e workshops se você não pratica aquilo que aprendeu. Para mudar, precisa viver de forma consciente, reconhecer e transmutar seus pensamentos negativos e ser sincera nas avaliações – suas e dos outros. Todas as experiências dolorosas da vida são aprendizados cujas lições podem contribuir para sua transformação. Algumas mensagens levam momentos para serem assimilados, outras, meses ou anos. Quando começar a compreender o significado dos acontecimentos da sua vida, você começou a crescer de fato e assim poderá abrir novas portas na sua vida, se usar a chave certa;
7. Encontre o equilíbrio entre o falar e o silenciar, se movimentar ou se aquietar. Procure se relacionar com pessoas que compartilham das mesmas buscas e que têm o mesmo nível vibratório. Participe de círculos de mulheres em que possa encontrar apoio para a sua jornada espiritual, em que possa confiar para expressar suas dores ou suas conquistas. Celebre a Deusa sozinha ou em grupo, encontrando assim a verdadeira fonte de seu poder, da sua cura e transformação. Cultive a Deusa dentro de você reconhecendo a sacralidade do seu corpo, da sua mente, das suas emoções, da sua vida. E ao reconhecer a Deusa dentro de si, você se tornará uma com Ela.

Texto de : Mirella Faur

A Consciência do Sagrado Feminino

Resgatando o passado, construindo o futuro



Durante os milênios da supremacia patriarcal, refletida nos valores espirituais, culturais, sociais, comportamentais e amparada pela hierarquia divina masculina, foi negada e reprimida qualquer manifestação da energia feminina, divina e humana. Resultou assim em uma cultura exclusiva e destrutiva, centrada na violência, conquista e dominação, com o conseqüente desequilíbrio global atual. Os homens - como gênero - não foram os únicos responsáveis pelas agressões e atitudes extremistas a eles atribuídas; a causa pode ser atribuída à maneira pela qual a identidade masculina foi criada e reforçada pelos modelos e comportamentos de “heróis” e “super-homens”. Fundamentados em seus direitos “divinos”, outorgados inicialmente por deuses guerreiros e depois reiterados pela interpretação tendenciosa dos preceitos bíblicos, os homens foram inspirados, instigados e recompensados para desconsiderar e deturpar as milenares tradições matrifocais e os cultos geocêntricos. Em lugar de valores de paz, prosperidade e parceria igualitária, foram instaurados princípios e sistemas de conquista, exploração e dominação da Terra, das mulheres, crianças e de outros homens.
Pela sistemática inferiorização e perseguição da mulher, o patriarcado procurava apagar e denegrir os cultos da Grande Mãe, interditando os seus rituais, “demonizando” e distorcendo seus símbolos e valores. A relação igualitária homem-mulher foi renegada, a mulher declarada um ser inferior, desprovido de alma, amaldiçoado por Deus, responsável pelos males do mundo e por isso destinada a sofrer e a ser dominada pelo homem. Os princípios masculino e feminino – antes pólos complementares da mesma unidade – foram separados e colocados em ângulos opostos e antagônicos. Enalteceu-se o Pai, negou-se a Mãe e usou-se o nome de Deus para justificar e promover o código patriarcal, a subjugação e exploração da Terra e das mulheres. A tradição, os cultos e a simbologia da Deusa foram relegados ao ostracismo e paulatinamente caíram no esquecimento. Patriarcado e cristianismo se uniram na construção de uma sociedade hierárquica e desigual, baseada em princípios, valores, normas, dogmas religiosos, estruturas sociais e culturais masculinas.
As últimas décadas do século passado proporcionaram uma gradativa mudança de paradigmas nas relações e nos conceitos relativos ao masculino e feminino. No entanto, para que este avanço teórico se concretize em ações e modificações comportamentais e espirituais, é imprescindível reconhecer a união harmoniosa e complementar das polaridades e procurar novos símbolos e rituais para o seu fortalecimento e equilíbrio. Com o surgimento progressivo de uma dimensão feminina da Divindade na atual consciência coletiva, está sendo fortalecido o retorno à Deusa e a revalorização do Sagrado Feminino.
Somos nós que estamos voltando à Deusa, pois Ela sempre esteve ao nosso lado, apenas oculta na bruma do esquecimento e velada pela nossa falta de compreensão e conexão com seu eterno amor e poder.
A principal diferença entre o Pai patriarcal, celeste e a Mãe cósmica e telúrica universal é a condição transcendente e longínqua do Criador e a essência imanente e eternamente presente da Criadora, em todas as manifestações da Natureza.
A redenção do Sagrado Feminino diz respeito tanto à mulher quanto ao homem. Ao esperar respostas e soluções vindas do Céu, esquecemos de olhar para baixo e ao redor, ignorando as necessidades da nossa Mãe Terra e de todos os nossos irmãos de criação. Para que os valores femininos possam ser compreendidos e vividos, são necessárias profundas mudanças em todas as áreas: social, política, cultural, econômica, familiar e espiritual. Uma nova consciência do Sagrado Feminino surgirá tão somente quando for resgatada a conexão espiritual com a Mãe Terra, percebida e honrada a Teia Cósmica à qual todos nós pertencemos e assumida a responsabilidade de zelar pelo seu equilíbrio e preservação.
O reconhecimento do Sagrado Feminino deve ser uma busca de todos, porém cabe às mulheres uma responsabilidade maior, devido à sua ancestral e profunda conexão com os arquétipos, atributos, faces, ciclos e energias da Grande Mãe.
Uma grande contribuição na transformação da mentalidade do passado e na expansão atual da consciência coletiva são os encontros de homens e mulheres em círculos e vivências comunitárias, para despertar e alinhar mentes, corações e espíritos em ações que visem a cura e a transmutação das feridas da psique, infligidas pelo patriarcado. Apaziguar a si mesmo, harmonizar seus relacionamentos, vencer o separatismo, reconhecer e honrar a interdependência de todos os seres, evitar qualquer forma de violência, dominação, competição ou discriminação são desafios do ser humano contemporâneo, no nível pessoal, coletivo e global. Incentivando a parceria entre os gêneros e a interação dos planos energéticos (celeste, telúrico, ctônico) criam-se condições que favorecem a expansão da consciência individual e contribuem para a evolução planetária.
Texto de: Mirella Faur